martedì 27 novembre 2012

"A mulher do chá" Alessandro Cannarsa publicado por "Res Lusitaniae"

Parabéns ao Alessandro pelo texto e ao Stefano pelo blogue Res Lusitaniae... E um abraço para ambos!


A Mulher do Chá


Numa genial história aos quadrinhos criada em 1966, Goscinny e Uderzo imaginavam que Astérix lutava com o primo britânico contra os romanos, mas que às cinco em ponto o aliado dele acabava de combater para tomar uma… chávena de água quente, pois ainda não havia chá na Europa: “Limão e açúcar?”, “Só uma nuvem de leite, obrigado!”.

É o clássico chauvinismo francês que nesta ocasião troça de um hábito característico dos bretões: um consumo de chá bem maior dos que os Europeus e os Norte-americanos usam juntos, bem maior que a quantidade de cerveja que os próprios bretões bebem!

O chá é uma bebida preparada através da infusão de folhas, flores, raízes de chá, ou Camélia sinensis, uma planta originária do sudeste asiático; os mais antigos documentos que testemunham o seu uso são do seculo X depois de Cristo. Na Grã-Bretanha, Thomas Lipton abriu a primeira casa de chá em 1706, mas não foi ele o protagonista da sua introdução no país, pois foi precedido por uma portuguesa, e esta é uma historia que vale a pena contar.

Quando Carlos II de Inglaterra em 1660 subiu ao trono, no fim do austero período da ditadura militar do puritano Oliver Cromwell, o país foi aliviado por uma presença bondosa, ao ponto que o rei foi nomeado “O alegre monarca”.
Ele casou-se em 1662 com a princesa Catarina de Bragança, filha de João IV de Portugal, que lhe levou um dote notável: a posse de Tânger e Bombaim, a abertura das rotas para Brasil e 500 libras, tendo obtido em troca inúmeros cornos (Carlos II tive catorze filho ilegítimos!) e a dedicatória do que hoje é o bairro nova-iorquino de Queens. Contudo o rei amava aquela mulher, que ele protegeu contra as acusações de conspiração católica, até se converter ele mesmo no leito de morte.

Nos anos sessenta do século XVII, na Inglaterra, uma onça de chá custava duas libras esterlinas (um operário ganhava acerca de cinco libras por ano!), e era usado só como remédio; além disso era de qualidade inferior relativamente ao que usavam chineses e japoneses.

Seja o futuro rei no seu exílio dinamarquês, seja a princesa portuguesa em Lisboa eram consumidores especializados de chá e tudo isto por uma razão fundamental: Dinamarca e Portugal estavam envolvidos numa luta feroz pelo comércio mundial do chá. De facto, Portugal teve duas primazias em relação à introdução do chá na Europa: a da introdução do consumo de chá e a introdução, em 1750, do cultivo do chá.

Foram produzidos, na Ilha de São Miguel em zonas de micro-clima como Porto Formoso e Capelas, 10 kg de chá preto e 8 kg de chá verde. No entanto seria só um século depois que, com a chegada de mão de obra especializada, a produção se tornaria consequente, passando a haver uma aposta na industrialização do processamento após a coleta das folhas.

No que diz respeito ao papel de Catarina na introdução do chá em Inglaterra, não há dúvidas que foi fundamental: em primeiro lugar ela buscava os melhores chás e sobretudo ensinou às mulheres da alta sociedade (lembre-se o alto custo da matéria prima) as maneiras melhores para preparar a infusão; além disso foi o facto de levar consigo a posse de Bombaim que permitiu aos bretões comerciar chá. De facto em 1675 já era possivel aos mais ricos comprar chá e no século seguinte a classe média começou a imitar esta moda.

Quando ficou viúva, Catarina voltou a Lisboa, onde aliás obteve a regência por doença do irmão Pedro II; morreu em 1705.
O mistério do nome

 
A palavra chinesa do chá tem duas formas completamente distintas de se pronunciar. Uma é 'te' que vem da palavra malaia para a bebida, usada pelo Dialeto Min que se encontra em Amoy. Outra é usada em cantonês e mandarim, que soa como cha e significa 'apanhar, colher'.

Esta duplicidade fez com que o nome do chá nas línguas não chinesas as dividisse em dois grupos: línguas que usam derivados da palavra Te: dinamarquês, holandês, inglês, italiano, francês, espanhol (aqui se vê a difusão do nome pelo comércio marítimo colonial); línguas que usam derivados da palavra Cha: hindi, persa, russo, turco, árabe (e aqui se vê a difusão por comércio caravaneiro tradicional); japonês e português (países ligados por antiga relação).

Como é evidente, foi prerogativa do rei Carlos II escolher para os ingleses o nome da bebida, mas foi a portuguesa Catarina de Bragança a fazer com que eles a saboreassem!
 
Alessandro Cannarsa

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